O dia seguinte

O dia seguinte

Acho que um dos principais pontos da conversa com a Jout Jout (pelo que vi nos comentários) foi o trecho sobre a “pesquisa do dia seguinte” e também sobre o fato de que a vida gira, então é melhor não se matar pode surgir um email mudando tudo no dia seguinte. É só dar play que começa bem nesse trecho, sobre a importância de vermos uma saída:

Na verdade, isso de “pesquisa do dia seguinte” é uma ideia que ouvi do Lama Padma Samten, ao comentar tragédias como a do tsunami de 2004 na Indonésia (estou tentando achar a fala no YouTube). É um exemplo para evidenciar a presença da natureza de buda, algo incessante e indestrutível que sempre segue.

Por causa desse trecho, me mandaram vários casos de “email do dia seguinte”. Um deles contado pela Barbara Coelho lá nos comentários do vídeo:

“Me lembrou um caso de um menino que o sonho era passar em medicina. Ele estava fazendo cursinho e, se caso não passasse, teria que voltar pra cidade dele ficar com a família, pois eles não tinham condições financeiras. Sisu saiu e ele não entrou. Acabou se suicidando. No dia seguinte saiu a chamada da lista de espera. Ele tinha conseguido.”

Nem sempre é assim. Me indicaram também essa fala do Kevin, que tentou se matar pulando da Golder Bridge, e sobreviveu. Aproveito também para indicar esse texto do Eduardo Pinheiro, que menciono quase sempre que surge uma conversa sobre suicídio.

Mas e quando não vem email no dia seguinte?

Surgiram também falas do tipo “Mas e quando não vem email algum no dia seguinte? Estou vivendo estagnada há anos…” Por isso essa coisa de “pesquisa do dia seguinte” é tão importante: mesmo sem email positivo, mesmo sem mudança, como é que conseguimos seguir respirando e vivendo mesmo em um vida estagnada? Tem algo milagroso presente que não estamos percebendo.

Claro, isso não exclui a melhora das condições: que todo mundo possa ter alguma boa notícia chegando! Que a desigualdade social se reduza e que possamos trabalhar nessa direção desde já, em cada micro ação. Ainda assim, o ponto principal é perceber que há algo em nós capaz de seguir mesmo sem boas notícias. Quando isso é reconhecido, é o começo do reconhecimento da natureza de buda.

Para reduzir a ideação suicida, no âmbito relativo, vale espalhar essa mente em nossa cultura: a vida gira, emails chegam no dia seguinte, há saídas possíveis. Mas, num âmbito mais profundo, a mente a ser espalhada é a do reconhecimento de nossa natureza de buda, aquilo que faz as saídas serem possíveis — algo livre, incessante, “não submergível” (como diz Lama Padma Samten), lúcido, compassivo, amoroso, alegre, imparcial, capaz de trabalhar com as piores situações e capaz de seguir até o dia seguinte.

Uma conversa com Dra. Ana Claudia Quintana Arantes

Tocada pelas diversas histórias recentes de suicídios e ideação suicida entre estudantes de medicina e universitários em geral, a querida Ana Claudia vai oferecer uma conversa online no dia 18 de janeiro. Se quiser participar, divulgar ou apoiar alguma participação, aqui está a página.