Nada dentro, nada fora: mundos sem fundação

Nada dentro, nada fora: mundos sem fundação

Do grande Francisco Varela, uma das citações que mais admiro:

“É fascinante que o mundo seja assim plástico, nem subjetivo nem objetivo, nem uno nem divisível, nem dual nem indissociável. Isso aponta tanto para a natureza do processo, que podemos perceber na globalidade de sua qualidade formal e material, como para os limites fundamentais daquilo que podemos compreender de nós mesmos e do mundo. Demonstra que a realidade não está simplesmente constituída por nosso capricho, porque isso implicaria supor a possibilidade de escolher um ponto de saída do interior.

Prova, além disso, que a realidade não pode ser entendida como algo objetivamente dado, que se pode captar, porque isso implicaria presumir um ponto de partida exterior. Demonstra, com efeito, uma ausência de fundamento sólido de nossas experiências, pelas quais nos são fornecidas determinadas regularidades e interpretações, fruto de nossa história conjunta como seres biossociais. No interior dessas áreas de história comum que se apóiam sobre acordos tácitos, vivemos em uma aparentemente interminável metamorfose de interpretações que se sucedem.*”

VARELA, Francisco. “O círculo criativo – esboço histórico-natural da reflexividade”. In: WATZLAWICK, Paul (org.) A Realidade Inventada. (Título original: Die erfundene Wirklichkeit, 1981) Campinas: Editorial Psy, 1994. (p. 314-315) *Nota do autor: “A expressão filosófica mais concisa que encontrei para essa conclusão é a Escola Madhyamaka.”

Mais sobre isso no capítulo 10 de VARELA, Franciso J.; THOMPSON, Evan; ROSCH, Eleanor. A mente incorporada: ciências cognitivas e experiência humana. Porto Alegre: Artmed, 2003.

Se possível, sugiro ler o original nessa nova edição.